sexta-feira, 30 de março de 2012

CRÍTICA: A eletrizante estreia de 'Avenida Brasil'

“Avenida Brasil”, novela das 21h da Globo, estreou sem que seu autor, João Emanuel Carneiro, perdesse tempo com liturgias consideradas imprescindíveis na teledramaturgia, como a (eventualmente longa e burocrática) apresentação de cada trama. Em vez disso, ofereceu de cara sua história bem construída e eletrizante, sem furos, capaz de arrastar o mais preguiçoso dos espectadores. Ospersonagens, fortes, impuseram-se ao público naturalmente. Foi também consequência da escalação de elenco matadora e da direção de atores competentíssima — Ricardo Waddington (direção de núcleo), Amora Mautner e José Luiz Villamarim (diretores-gerais).
Vimos um primeiro capítulo impecável em todos os aspectos. Já na estreia, ficou claro: “Avenida Brasil” é para ser acompanhada com atenção, ou corre-se o risco de perder o fio da meada; por outro lado, é preciso uma dose de espírito contemplativo para apreciar a luz bem feita, os planos caprichados, enfim, usufruir de uma produção que se aproxima do cinema.
“Falar para a classe C”, lema repetido ad nauseam nos últimos tempos pelos realizadores de TV, não significa fazer um simulacro daquilo que se acredita ser o universo deste telespectador. “Avenida Brasil” entendeu isso. Tem acima de tudo este mérito: escapa à caricatura e à literalidade fabricando um ambiente próprio. Seu subúrbio não é delirante e possui inúmeros elementos de realidade, mas foi digerido pela cabeça pensante de um criador. Ele surgiu apenas sugerido via imagens de trens, de copos de cerveja, de uma mulher passando gelo no rosto para espantar o calor etc. Não precisa ir muito fundo em semiologia para entender que essas são representações, signos, sinais, alegorias que, por analogia, fazem o público pensar num universo e o transportam para ele. A novela dá uma rasteira no imitativo e no explicadinho e aposta na capacidade do telespectador para completar espaços em branco. Essa inteligência está também nos figurinos, na direção de arte e na cenografia.
O elenco brilhou. A vilã Carminha promete ser um divisor na carreira de Adriana Esteves. Ela mostrou que estava pronta para a missão. Tony Ramos, o Genésio, deixou para trás o tipo ingênuo demais e obteve a simpatia do público como aquele que só não driblou o malfeito da malvada mulher porque morreu antes. A menina Mel Maia é um gênio precoce; pena que sua participação será breve. Murilo Benício, um ator completo, domou totalmente as limitações de voz do passado. Quem duvida do alcance do seu Tufão? Além deles, Eliane Giardini, Marcelo Novaes, Heloísa Périssé e Fabiula Nascimento se destacaram. Débora Bloch e Camila Morgado dividem um marido fissurado por ruivas, personagem de Alexandre Borges. Na estreia, o trio esteve bem, mas ali, o risco da repetição é grande. Se João Emanuel os mantiver presos a uma situação cômica eterna, eles podem ficar reduzidos à dimensão de um quadro de programa de humor. É esperar para ver.
Patricia Kogut

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